José Alberto Quaresma

José Alberto (de Oliveira) Quaresma nasceu em Portimão. Licenciou-se em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Prosseguiu estudos em História Moderna e Contemporânea, na Universidade de Paris- Sorbonne (Paris IV), com Pierre Chaunu e André Corvisier e em História das Mentalidades Religiosas, no Collège de France, com Jean Delumeau. Foi docente do ensino secundário e formador de professores. Publicou artigos em revistas científicas e apresentou em vários fóruns comunicações sobre História, História das Mentalidades, Sociedade e Sistema Educativo. Tem, como colunista, colaboração dispersa por vários periódicos, nomeadamente, O Independente, Público, Expresso, Correio da Manhã, Domingo Magazine. Obteve o Prémio Revelação de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1989), pelo livro A Pose Extática, (Afrontamento). Publicou Ecolalia, poesia (Vega) e, na mesma editora, Direito ao Erro – A Batalha da Educação em Portugal. Foi autor de «Falta de Castigo – O Blogue da Educação e da Falta Dela», no semanário Expresso, entre 2008 e 2014. Coordenou as Comemorações do 122º Aniversário do Nascimento de Manuel Teixeira Gomes (1982-1983). Foi comissário para as Comemorações Nacionais dos 150 Anos de Manuel Teixeira Gomes (2010). É autor de Manuel Teixeira Gomes – Biografia (Imprensa Nacional – Casa da Moeda / Museu da Presidência da República

João de Deus 190 anos

Mais uma volta redonda no calendário da eternidade de João de Deus. Regressa, como sempre, pela cauda do Inverno. Celebram-se 190 anos sobre o seu nascimento. Está bem vivo. Muitos reparam. Outros, nem por isso. Podiam procurá-lo. Passar lá por casa. Entrar na sua intimidade. Conhecê-lo melhor. Merece. 1815. São Bartolomeu de Messines. Isabel Gertrudes, da Amorosa, e Pedro José, de Alcantarilha, aqui encalham. Não tarda, celebram casório. Amores firmados, filharada a rodos. Concebem uma dúzia. Perdem um terço. João de Deus, nascido a 8 de Março, recebe o nome do irmão mais velho, falecido pouco depois do nascimento. Dar …

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Ronaldinhos

Cristiano Ronaldo fez 35 anos. Até poderia fazer menos. O vigor não seria menor. Surpreende? Claro. Ronaldo é um rico atleta. E um atleta rico. Muito rico. Modelo para menino que se preze, na parte do rico atleta. Na parte do atleta rico, é mais exemplo para pai de menino. O currículo de Ronaldo impressiona. Não vale a pena esmiuçá-lo. Toda a gente o conhece. O pai do menino, melhor do que ninguém. E o menino também. A parte do currículo que interessa ao menino é boa. Espevita-lhe os sonhos no silêncio da noite. Estádios a abarrotar. Vê-se em fintas …

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De predador a perdedor

Homem do sexo masculino é predador. E de predador a perdedor vai um passinho. Suave ou abrupto. Longo ou curto. Acontece. Sempre. Não o deseja. Nem acredita na mudança. Almerindo, assim que lhe despontou o buço, começou a ser notado. Bonitinho. Espigado. Pérolas magnéticas nos olhos. Era desejado. Ou assim se sentia. Com 15 anos, chegou às primícias da carne. Não como o seu pai, já que os tempos eram outros. Papá foi, pela mão do avô, franquear a porta da casa de meninas da rua do Carapeto. Era o costume. Iniciação rápida. Profissional. Papá entrou petiz. Saiu, minutos depois, …

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De costas para ti

Amo-te. Deixa-me estar frente a ti. A repousar meus olhos. Tua boniteza atrai-me. Desde sempre. Intimidas-me. És grande. E frio. Raro me dás um afago morno. Por estes dias, não me atrevo a descer até ti. Tens bramidos que parecem vir do fundo da alma de homens malvados. Sacolejas-te muito. Enfureces-te, não raro. Teus perdigotos salpicam-me o rosto. Perturbas-me. Quando te olho, enterneço-me. Nada vejo para além de ti. A não ser a ténue linha ao fundo. A do teu silêncio. Onde te dobras. Finges desaparecer. E continuas mais além. Onde imagino que te não deixas prender. Fazes parte de …

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Cãogalhão

Um cão é um cão e a sua circunstância. A circunstância do cão é o cãogalhão. Ortega y Gasset, antropocêntrico, só viu que “o homem é o homem e a sua circunstância”. Nunca pisou a circunstância do cão. Cãogalhão. Objecto urbano salutar. Obus, portanto. Não voa. Só desliza e aterra. Decora calçadas, jardins, terraços. Até dentro de um lar doce lar é plantado. Aqui, os donos resignam-se. Até à plantação seguinte. À volta de um cãogalhão, há sempre um charco fragrante. O charco seca. A fragrância mantém-se. É a persistência idiossincrática lusa do cãogalhão. O cãogalhão é obstinado. Transmuta-se. Volta …

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Seco ao Sol

Agosto já se foi. Setembro finou-se. Outubro arrebita. Há quem goste mesmo do Outono. Exija Outono ou nada. Só que o Verão não debanda. Em Agosto estiveram cá todos. Eu também. Vi-os. Vi-me. Com estes olhinhos que a pira há-de fundir. Estarei fundido. Sabe-se lá quando. Que seja para o tarde. Gosto de aturar Agostos. E suspirar por Outubros. Molengo mas inteiriço. Em Agosto, consegui fugir para Sotavento. Dois dias. Não se pode exigir mais a um sedentário. Só que Agosto cerca-o por todo o lado. Sempre. Praia estreita. Uma nesga do que era há meio século. Entalada entre espigões …

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Banco Alimentar o Banco

– Os bancos gostam dos bancos alimentares? – Na sei. Talvez. – Alimentam-se também deles? – Na me parece! Na se vê ninguém a comer uma sande num banco. Mas se o alimento dos bancos é dinheiro, nesse sentido sim, alimentam-se. – E os hipermercados alimentam-se das campanhas dos bancos alimentares? – Que jeite! Até odeiem. Quer-se-dizer, agora que falas nisso… – Então não vendem mais? – Na tou a olhar prás registadoras. Mas devem vender. Se pessoa sai de casa com um rol de com-pras e gasta mais do que tinha pensado, os supermercados vendem mais. – E o …

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Mulher cega, Homem surdo

O ideal no casamento é que a mulher seja cega e o homem surdo. O aviso não é meu. É do Sócrates. O outro, o de Atenas. A certeza tem mais de dois mil anos. Quem somos nós, hoje, para duvidar? É de acrescentar, àquelas qualidades, a mudez. Sócrates não a tinha. Falava pelos poros todos. O homem era feio, gordo, desmazelado. Mas ninguém o calava. Andava descalço pelas vielas e praças de Atenas. Debitava avisos, conselhos, recomendações. Ouvia toda gente. Questionava. Esgrimia argumentos. Discutia muito. A sua missão de educador era tida como divina no século V antes de …

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Par de Córneas

Cego e surdo. Ninguém deseja correr o risco. Nem eu. Há quem vele por mim. Registo o cuidado. Não sei se quem ainda consegue ler estas linhas é notado. Ou se já tem deficiências visuais e auditivas graves. Oxalá, não. A cidade está pejada de estabelecimentos para venda de óculos para a boa vista e de aparelhos contra a má surdez. Ruas prevenidas. Em cada esquina um amigo. Em cada rosto bondade. Procuram, julgo, gente de vistas curtas e de surdez larga. Bata branca. Gravata ajustada. Sorriso ajustado a interpelar os passantes. O sorriso abre-se em representação da nacional ou …

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Estraga- albardas

O estroina anda outra vez destrambelhado. Assim que lhe caíram uns cêntimos a mais no ordenado, desatou a fazer vida de rico. Ou a imitá-la. O número de famílias endividadas tem vindo a aumentar. Cresceu muito no ano passado. Houve 29.350 pedidos de ajuda ao Gabinete de Protecção Financeira da Deco. Mais 350 do que no ano anterior. Há quem não tenha conseguido pagar, em 2018, o empréstimo acabado de contrair… em 2018. Provavelmente porque 2018 não teve 24 ou 48 meses como seria devido. Em cada família super-endividada há pelo menos um estroina superlativo. Normalmente o superlativo é o …

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