Provavelmente esta crónica vai ser muita fraca em conteúdo, mas, uma coisa eu sei, o engodo do biológico é, por si só, um chamariz para chamar (perdoem-me o pleonasmo mas preciso de reforçar a ideia) a atenção de uma grande franja de leitores.
Peço desculpa desde logo aos amantes de enlatados, carnes processadas e toda uma panóplia de produtos que teimam abnegadamente em incluir conservantes com nomes iguais aos modelos de vários Mercedes, como E330, E340 e por aí fora. Estes produtos fazem ainda gala das suas embalagens coloridas e vistosas, uma vez que, embalagens com ar de papel reciclado não têm credibilidade nem estatuto para acomodar as delícias que se escondem no seu interior.
Posta esta minha declaração inicial vamos ao que interessa.
Há dias dei por mim a pensar no poder e na capacidade que a designação biológico (BIO) tem para atrair, seduzir e incentivar as pessoas. Não digo que incentive todas sem excepção, até porque já pedi desculpa aos leitores mais conservadores que ainda não trocaram uma lata de salsichas por um punhado de bagas Goji com iogurte.
Uma coisa é certa, pouco a pouco, o biológico vai conquistando toda a gente. Certamente o leitor atento já reparou no espaço que esses produtos ocupam nas prateleiras dos supermercados. O que antes só era possível encontrar num lugar recôndito da loja, agora escancara-se em frente aos nossos olhos desavergonhadamente e ganhou destaque nos locais mais privilegiados da mesma.
Tenho reparado nos últimos tempos em muitos carrinhos de compras a transbordar de saquinhos de sementes que davam para alimentar grande parte da passarada migratória que chega ao nosso país em busca de uma vida melhor.
Até aqui, aparentemente, tudo bem, não fosse a indústria dos alimentos, já há muito ter percebido que com papas e bolos sem enganam os tolos.
E é neste nicho de mercado, que a indústria, ao colo do capitalismo, vai singrando cada vez mais e impondo o BIO como o El Dorado daquilo que tem para oferecer.
E a receita é, por sua vez, de uma simplicidade assustadora, reparem:
Embrulha-se umas maças pequeninas (aquelas que iriam para o lixo por não atingirem o calibre necessário), coloca-se 4 numa cuvete de papel (atenção que tem que ser de papel), cola-se um pequeno rótulo com a insígnia BIO e, por fim, triplica-se o preço face às maçãs mais bonitas.
A mim isto parece-me uma ideia genial! E note-se, que uma das premissas do BIO é o preço. Se não for caro, o comprador astuto desconfia logo. Portanto, quanto mais caro melhor. Quanto mais caro, mais vitaminas e sais minerais contêm e logo mais benéfico para a saúde.
Falei de maçãs como poderia falar de uma vastidão de produtos, mas sendo isto uma crónica não me posso alongar, nem tão pouco vos quero maçar com esta conversa fiada.
E a bandeira do BIO veio para ser hasteada em todo o lado para marcar a diferença face aos produtos de segunda e terceira categoria. Além do mais, o BIO não vem sozinho, à semelhança dos partidos políticos actuais, fazem alianças. E o aliado perfeito é o já consagrado e bem conhecido LIGTH, que começou logo a conquistar terreno nos anos 90. Quem não se recorda do SG LIGTH (ainda roubei uns quantos ao meu pai).
Pois é BIO + LIGHT não tem como enganar. Quem preze a sua saúde nem pensa duas vezes: é aviar o carrinho e depois na hora de pagar logo se vê. Não vai com notas, vai com cartão, vai a crédito, vai como tiver que ir.
Escrevendo um pouco mais a sério: será que estes produtos são superiores face aos outros? Valerá a pena o investimento? Não teremos simplesmente a julgar o livro pela capa (no sentido em que a boa capa nos conduz a um bom livro)?
É impressão minha ou este título cativou mais leitores? Aposto que não. No entanto, peço desculpa sobretudo aos fans das latas de salsichas, que, mesmo evitando a todo o custo, se deixaram levar pelo engodo, aos outros, eu percebo, eu também quando vejo reluzir as letras BIO, não resisto.