Março

Em março, a primavera, no hemisfério norte, está para chegar, mas a paz na Ucrânia, infelizmente, não. Antecipo aquilo que é logicamente previsível, mas não consigo acertar com rigor no incerto. É uma das principais diferenças entre o mundo físico, regulado pelas leis da natureza, e as vontades dos homens, a par dos desígnios dos deuses, desreguladas pela improbabilidade dos acontecimentos. Tudo é improvável até se provar o contrário.

A luminosidade dos dias cresce, a certeza de uns dias amenos de primavera já rareia, por experienciar, nos últimos anos, uma mudança repentina entre o tempo frio de outono/inverno e o tempo quente de primavera/verão. Pelo menos assim, poupamos nas vestimentas de meia estação, mas ficará por vestir aquele casaco impensável no verão e pouco aconchegante no inverno. Para mim, um dos principais problemas são os casacos.

O Algarve tem destas coisas, é difícil usar uma variedade de roupagens para diferentes climas, para as diferentes estações do ano. Aqui, ultimamente, ou estamos no nosso inverno, mais ou menos ameno, ou no nosso verão, mais ou menos escaldante. Ficamos sempre no mais ou menos, mas nunca na primavera nem no outono meteorológico. Nunca num tempo ameno para os passeios familiares e os piqueniques de um maio primaveril.

Outrora, na Roma Antiga, março era o primeiro mês do ano, em alusão a Marte, deus da guerra, início de uma nova temporada das campanhas militares, por isso a minha pouca crença num terminar das guerras de assolam a Europa e o mundo, não só nas martirizadas Ucrânia e Síria.

Em diferentes eras e regiões do planeta, o início coletivo era, e ainda é, em março, mas, em todos as épocas e lugares, o início individual é sempre quando um novo ser humano nasce, mesmo em tempos de guerra. E a cada ano, que se repete a singularidade desse momento, sentimos que algo em nós pode sempre principiar de novo. A nossa vida é, assim, uma infinidade de novos começos, até ao esperado, mas evitado, instante do fim.

Um recomeço de paz para a Ucrânia, para todos os povos, nesta época em que a vida renasce, quando todos nós já entranhamos os sons e as imagens de guerra, abrangendo os próprios martirizados, e a situação trágica de milhões de pessoas por todo o planeta, incluindo aqueles que morrem a cruzar as linhas fronteiras, de terra, de mar ou de preconceito, imaginadas e desenhadas por cada um de nós.

Por falar em março, as águas de março fechando o verão, mas isto é no hemisfério sul.

Veja Também

Tabuada do oito

Numa época em que muito se tem falado de educação, particularmente do cansaço dos professores …

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado.