A rapariga muçulmana no shopping percorre as arcadas numa passada regular e constante. Telemóvel na mão. Eixo de si própria no pequeno planeta de informação que tem na mão.
A rapariga muçulmana percorre as arcadas do Forum, numa passada regular e constante. Sempre ligada. Telemóvel na mão. Com um bonito lenço azul que contrasta com o negro da comprida túnica. Há nela uma diferença, uma inquietação, que desperta a minha curiosidade.
Os passos em volta, passando vezes sem conta em redor. Interrogo-me sobre o movimento incessante e a concentração no pequeno ecrã/universo luminoso. Eixo de si própria no pequeno planeta de informação que tem na mão.
Jovem, muito jovem. Já a tinha observado numa tarde de Verão em que saltava, com o irmão mais novo, no grande trampolim montado no centro comercial. A sua figura sobressaía exótica e algo anacrónica. Alta e coberta, brincando, no meio de crianças bem mais novas. Em cada salto, compondo cuidadosamente o lenço, com a preocupação de não descobrir o cabelo.
Compreendo que vens de uma cultura e religião em que os pais e a sociedade te educaram a não mostrar o cabelo, uma madeixa que seja. Relembro a jovem iraniana Mahsa Amini, morta pela polícia moral do seu país.
Bem-vinda sejas ao Algarve, menina muçulmana. Estás na grande praça, no centro do mundo, onde o teu metódico caminhar, numa sexta à noite, tem a concentração espiritual de uma oração de liberdade a crescer em ti.
Há um Deus que sobrevive na identidade dos nossos sonhos.