Há umas semanas, foi assaltado o armazém de um restaurante de Armação de Pêra. Da observação das imagens captadas pela câmara de vigilância, apenas se podia assegurar que eram, provavelmente, dois homens.
Na edição online do Terra Ruiva publicamos a notícia, acompanhada pela imagem que os proprietários do estabelecimento divulgaram. Uma imagem tosca, com pouca definição. De entre os comentários que a notícia mereceu, no Facebook, destacaram-se os que atribuíam a autoria do assalto a imigrantes. Sem provas, sem investigação, sem suspeitos detidos e condenados. De tal forma que, quem inadvertidamente chegasse àquele conteúdo, ficaria com a impressão de que só começou a haver assaltos nesta vila quando surgiram os imigrantes.
E há muitos. A zona do parque infantil, junto ao Casino, tem horas em que não parece território português, tal a quantidade de crianças estrangeiras que aí se acumulam. Há quem lhe chame a Bolywood de Armação de Pêra. Na avenida, junto ao mar, há sempre grupos de homens, indianos e paquistaneses, sobretudo. E é crescente o número de estabelecimentos comerciais, de todo o género, detidos por imigrantes, que têm vindo a ocupar as lojas mais perto da praia.
Há muita gente que diz que lhe faz impressão ver tantos estrangeiros. E são realmente estrangeiros. Diferentes. E muitos. E faz-nos impressão esta nova realidade que se instalou nas nossas ruas, temos de admitir sem hipocrisias.
E embora Armação de Pêra seja o rosto mais visível desta imigração pobre, porque é nas zonas balneares que há mais falta de mão de obra, e ao mesmo tempo mais habitações para alugar, os imigrantes estão por todo o concelho, toda a região, todo o país.
E são um factor que tem ganho uma importância, cada vez maior, nas sociedades europeias, a braços com uma massa humana que dá muito jeito ter quando é necessária, mas que se gostaria de ver longe dos nossos olhares, terminada a jornada de trabalho. Era assim com os portugueses que iam para França, empurrados para as periferias, onde viviam em bairros de lata, sem eletricidade, água ou saneamento, os chamados Bidonville, que só acabaram nos anos 80 do século passado.
Explica a psicologia mais básica que o desconhecido gera ansiedade. E medo. E que, ao termos de atribuir as culpas a alguém, iremos fazê-lo preferencialmente a quem não conhecemos. Claro está que as estatísticas mostram, sem margem para dúvidas, que a esmagadora maioria de crimes está relacionada com pessoas da comunidade, gente conhecida – amigos e família quando se trata de crimes graves. Mas termos conhecimento de uma realidade não significa compreendê-la, nem aceitá-la, muito menos agir em conformidade.
Uma das promessas do recém-eleito presidente dos Estados Unidos da América é a de deportar 11 milhões de imigrantes, para o que terá de gastar uma quantia astronómica. A expulsão de imigrantes irá trazer uma forte instabilidade económica, particularmente em atividades dependentes dos trabalhadores ilegais, como a agricultura e turismo. As mesmas que em Portugal, a par da construção civil, onde é gritante a falta de mão de obra e o prejuízo que isso causa às empresas e impede a concretização de obras públicas importantes.
Nesta região, a força de trabalho dos imigrantes tornou-se fundamental, palavra dos empresários de turismo. Que falam em “importar” gente de outras paragens.
Tendo em conta esta realidade torna-se necessário, de uma vez por todas, não continuar a fazer de conta que estas comunidades de estrangeiros não existem por todo o concelho. Umas mais visíveis, como em Armação, outras menos, mas bem expostas quando se percorrem as serras e restaurantes/cafés das freguesias de Silves, Messines e São Marcos da Serra.
Há que fazer um esforço de reconhecimento e integração, não obstante as dificuldades que se conhecem. É muito óbvio que as entidades públicas do concelho têm de dar os primeiros passos. Ainda não é tarde. Mas quanto mais tarde mais difícil será.