Bolas de Berlim

Estará dado o mote para as autárquicas que se aproximam? Fiquei com esta dúvida ao assistir à mais recente sessão da Assembleia Municipal de Silves, realizada nos primeiros dias de agosto. Socorri-me da gravação da sessão, publicada na página de Facebook da Câmara Municipal de Silves, para assistir a mais um momento daqueles que levam as pessoas a afastarem-se da política. O assunto de relevo nesta sessão era a votação de uma proposta apresentada pelo Executivo camarário, da CDU, para uma nova estrutura orgânica da Câmara Municipal, que se propunha separar as atuais divisões (que englobam várias áreas de atuação) em divisões mais pequenas. Com o objetivo de tornar a sua ação mais produtiva, eficiente e rápida, além de pretender acomodar as novas responsabilidades que passaram para as câmaras, por via da delegação de competências feita pelo anterior Governo, e de responder às novas exigências legislativas e de trabalho.

Já deviam era terem feito isto há mais tempo, pensava eu, partilhando da opinião das bancadas do PS e do PSD que, além disso, mostraram-se favoráveis à proposta apresentada pelo Executivo CDU, não se opondo ou discordando. No entanto, na votação, PS, PSD e Chega chumbaram a proposta do Executivo. Fiquei um tanto incrédula, sem compreender muito bem como se chumba uma proposta com a qual se concorda.

O representante do Chega não disse uma palavra sobre o assunto, nem antes nem depois da votação, mas o PS e o PSD apresentaram uma declaração de voto que os meus caros leitores poderão ouvir, e tirarem as suas próprias conclusões…

Um resumo: o PSD considera necessário proceder a essa alteração orgânica, mas este é um “momento inoportuno” porque “estamos a um ano das eleições”, e deve ser o novo executivo que delas resultar a fazê-la. O PS também acha necessária, mas está contra a contratação de mais funcionários e, nas suas próprias palavras, não entendeu bem o documento com o novo mapa de pessoal que esta mesma Assembleia Municipal  aprovou na anterior sessão, decorrida em Armação de Pêra.

Refiro apenas que o Executivo camarário negou a necessidade de contratar mais pessoal, além dos números já apresentados e aprovados no referido Mapa de Pessoal (que prevê um aumento na ordem dos 180 funcionários, muitos dos quais por via da delegação de competências).

E que, manifestamente, como sublinhou Rosa Palma, faltando ainda 14 meses para as eleições autárquicas, há ainda muito tempo para o executivo em funções, de uma forma legítima, quer do ponto de vista legal quer moral, tomar medidas e decisões e implementá-las.

Pessoalmente, preocupa-me que uma força política possa chumbar uma proposta que considera boa com o argumento de que faltam 14 meses para as eleições. Só faltava que o executivo em funções, qualquer que seja a sua cor, se veja condenado a “picar o ponto” porque daqui a um ano vai haver eleições. Ou que se chumbe uma medida que se considera oportuna apenas porque não queremos contratar mais funcionários, sem fazermos prova de que os mesmos não são necessários ou de que não há sustentabilidade financeira para essa contratação.

Ou alguém já está a fazer contas (erradamente) que, neste momento, contratar mais cento e tal funcionários poderá representar mais cento e tal votos numa determinada direção?

Não tendo ouvidos críticas ou reparos à proposta em concreto, fico a pensar que é exatamente por estas questões da politiquice que pessoas sérias e interessadas se afastam dos partidos e do que consideram ser a forma errada de fazer política.

Para alguns, parece difícil fugir à tentação de formar uma aliança e impor decisões que são contrárias à vontade de quem governa, seja a nível nacional, com a AD a enfrentar as dificuldades de um governo minoritário, seja em Silves, como aconteceu no início deste mandato autárquico, quando o PS, PSD e Chega fizeram um acordo para afastar a CDU, a força mais votada, da presidência da Assembleia Municipal. O que indiciou, desde logo, as ambições políticas e pessoais que se manifestaram e que tipo de alianças se formaram, as quais, não tenho dúvidas, se revelarão no momento oportuno. Daqui a alguns meses…

Mas a frase tornada famosa, “deixem-nos governar” continua a fazer sentido. Quando chegar o tempo aí se verá se a governação foi certa ou errada. Até lá, não podemos perder o pé. Pende sobre todos os que sentam na Assembleia Municipal de Silves e nos restantes órgãos autárquicos a responsabilidade acrescida de tomarem medidas movidos pelo interesse público e benefício das populações. Isso será o que permanece.

E quem se alojar no terreiro da politiquice, visando conquistas pessoais ou políticas sem mérito, mesmo que tenha um êxito momentâneo, não permanecerá intacto.

Ao fim e ao cabo, já se sabe há muito que a política é como uma bola de Berlim. Exceto que o seu recheio não é doce.

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