Para os navegantes com vontade de vento, a memória é um ponto de partida
Eduardo Galeano, Palavras Andantes
Pensar é também construir o futuro. Com ousadia e sem temor. Silves é, no presente, praticamente monumentos e turismo: que vive precisamente da riqueza do seu monumental património histórico edificado (castelo, arco da almedina e sé) e arqueológico (poço cisterna/museu municipal). E o grande evento que é a feira medieval tem na sua malha urbana mais antiga o espaço ideal para a sua realização. Ou seja, o nosso rico património arquitetónico e histórico é testemunho de um passado significativo e fonte de sustentabilidade económica (turismo).
Mas existe também uma História mais recente, já do século XX, com expressão igualmente no património edificado, merecedora de mais atenção. Refiro-me ao palácio Grade (1907) e ao Cineteatro Silvense (1961). Edifícios votados ao abandono. E não deveria ser a inércia de uma família e a estupidez humana a prejudicar o que poderiam ser bens propriedade cultural futura de toda uma comunidade.
Assim, voltando à carga, penso que a recuperação e renovação do antigo cinema, de raiz ou em parte, como auditório com escalas e projeções de palco e plateia, tecnicamente equipado, para receber determinados espetáculos (concertos, dança, teatro e cinema, claro!) constituiria uma mais valia como equipamento cultural que a cidade não tem, a par da coabitação de outras valências, comercial por exemplo, no projeto. Esta renovação e atribuição de uma função social e cultural a um edifício que a cada dia que passa se degrada, (podendo até vir a ruir), integrada na requalificação urbana da zona pública envolvente, poderia dotar esta zona da baixa de uma nova atratividade e vivência citadina.
Quanto ao palácio Grade há muito tempo que deveria ter sido expropriado e daria lugar, por exemplo, a um centro cultural, com espaço para exposições, sede de associações, local de formação e criação. E também aí, a nova vida atribuída a um edifício devoluto, permitiria dar uma nova dinâmica social diária a uma rua que foi outrora uma das principais artérias comerciais da cidade.
A identidade, aquilo que somos, não pode viver ou subsistir apenas na sombra do passado por mais glorioso que este seja. Ou será que herdeiros de tanta história ficámos cansados e nos damos por satisfeitos com o que temos?…
Precisamos de construir o futuro. Da arquitetura do amanhã. De planear com vontade e a ambição política e cívica de fazer mais. E temos arquitetos naturais da cidade e do concelho, como Ricardo Camacho e Pedro Reis, que bem poderiam ser convidados a projetar o futuro da cidade.