O Terramoto de 1755 em Silves

O grande sismo de 1 de Novembro de 1755 e o tsunami por ele gerado afectaram com enorme gravidade todo o Algarve e, em particular, o litoral do Barlavento (Albufeira, Armação de Pera, Portimão, Lagos).

A cidade de Silves, não sendo atingida pelas ondas do tsunami que ainda entraram pelo Rio Arade, sofreu consideráveis danos e vítimas provocados pelo terramoto de que, temos notícia com algum pormenor, logo no dia 3, através de uma carta remetida de Lagoa à “Gazeta de Lisboa” e publicada a 6 (nº 47):

A cidade de Silves, que dista uma légua deste lugar e que tinha neste tempo a sua grande feira, perdeu-se a sua Sé, Torre, Castelo e Muralhas, Casa da Câmara e da Audiência, a Cadeia, um Convento de Religiosos Terceiros de S. Francisco, situado fora dos seus muros, e ruas inteiras ficaram arruinadas, perdendo-se nelas infinita gente, que se anda desenterrando para se lhe dar sepultura, e as fazendas de mercadores, ourives, e outros oficiais.

Alguns dias depois, foi possível uma informação mais rigorosa quanto às vítimas e o pároco registou no Livro de Óbitos (1752-1761, fls. 77v-78) o nome das pessoas que morreram em Silves por causa do terramoto, num total de 14 vítimas e com a particularidade de nenhuma ser da cidade, propriamente dita, facto que se explica porque o terramoto se verificou no dia da feira. Nove dos mortos eram dos arredores. Três eram do termo do concelho (aldeia dos Cordeiros – S.B. Messines, Algoz e Alcantarilha). Uma mulher da família Pincho, de Alfontes (Guia), conc. Albufeira. E uma mulher degredada em Silves pelo Santo Ofício, da qual o pároco omitiu o nome.

Lista das 14 vítimas do terramoto de 1755 em Silves

O assento com a relação das vítimas foi registado, pelo prior Pedro de Ataíde Mascarenhas, a seguir a um registo de 21 de Outubro e antes de outro de 22 de Novembro (cerca de um mês sem registos de óbitos e enterramentos). Com transcrição modernizada, publicamos a lista das 14 vítimas:

Número de pessoas que morreram por causa do terramoto que fez em o primeiro de Novembro da presente era de mil e setecentos e cinquenta e cinco anos e seus nomes e pátrias.

1.Maria Rodrigues, mulher de Manuel Rodrigues, do sítio das terras do Paço, freguesia do Algoz.

2.José, filho de José Gonçalves, do sítio da Franqueira, freguesia desta cidade.

3.José Gomes, do sítio do Monte Pinheiro, freguesia da cidade de Silves.

4.Maria Andreza, mulher de André Cabrita, da aldeia dos Cordeiros, freguesia de São Bartolomeu.

5.Margarida Bentes, mulher de Estêvão Andrés, do sítio de Faxelhas, freguesia desta cidade.

6.Maria de Jesus, mulher de António Correia, do sítio de Poço Barreto, freguesia desta cidade.

7.Francisco Coelho, dos Montes Grandes, freguesia desta cidade.

8.Vicente Lourenço, da Vala, desta cidade.

9.António Lourenço, da freguesia de Alcantarilha.

10.Catarina de Jesus, mulher de Romão Gonçalves, de Odelouca, freguesia desta cidade.

11.Maria Teresa, viúva, do sítio da Vala, desta freguesia.

  1. Maria da Silva, mulher de António Lourenço, dos Tufos, sítio desta freguesia.

13.Mónica Pincha, da freguesia de Alfontes, termo de Albufeira.

  1. Uma mulher degredada nesta cidade pelo Santo Ofício.

Em 1758, o mesmo pároco, que serviu a freguesia entre 1744 e 1769, deu mais informações sobre as consequências do terramoto na cidade:

Padeceu esta cidade grave ruína no terramoto de mil setecentos e cinquenta e cinco, pois tanto a igreja paroquial como as ermidas caíram e se acha reparada e consertada a paróquia, como também a ermida da Senhora Mãe dos Homens e a da Senhora dos Mártires e de São Pedro e de Santo Estêvão. (ANTT, Memórias Paroquiais de Silves, 1758 – “Dicionario Geográfico”, vol.35, fls.1271-1281 )

Muitos anos depois, surgiram novas informações que as fontes mais próximas do acontecimento não tinham referido:

Pelo terramoto de 1755 sofreu toda a cidade consideravelmente. Ficou quase arrasada, só vinte e nove casas deixaram de cair, morrendo quatorze pessoas, a maior parte na Sé. (João Baptista da Silva Lopes, “Memórias para a História Eclesiástica do Bispado do Algarve”, Lisboa, 1848, p.120).

Estranha-se a precisão da referência às 29 casas, não mencionadas antes, e a afirmação de que a maior parte das mortes teria ocorrido na Sé, o que não é confirmado pela lista de vítimas.

Para aprofundar o conhecimento sobre os efeitos do sismo de 1755 em Silves e no concelho, bem como sobre as evidências arqueológicas detectadas e sobre o histórico de tsunamis e risco sísmico no Algarve, vejam-se, com proveito, as seguintes publicações: Francisco Luís Pereira de Sousa, “O Megassismo do 1º de Novembro de 1755 em Portugal (…), Distrito de Faro”, vol. I, Lisboa, 1915, pp. 72-80 (concelho de Silves): AAVV, “Estudo do Risco Sísmico e de Tsunamis do Algarve”, Autoridade Nacional de Protecção Civil, Lisboa, 2010: Mário Varela Gomes, Rosa Varela Gomes, Testemunhos Arqueológicos do Terramoto de 1755 em Silves, in “Arqueologia & História”, vol. 68, Lisboa, 2016, pp. 155-165.

 

 

 

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