(Esque)cimento Global

São sete horas. O sol ainda não nasceu. Mais um dia sem chuva. Quente para a época. Tem sido uma constante, não fora os dias curtos onde a noite cai pelas torradas com marmelada da tarde, o que equivale a dizer, entre as cinco e meia e as seis, e uma temperatura nocturna menos recomendável, arriscaria a dizer que o Inverno ainda não chegou.

O clima mudou. Parece que estou a dizer uma daquelas verdades de La Palise. Toda a gente (aquela entidade misteriosa) sabe isso. Vai ouvindo aqui e ali. Apercebendo-se vagamente. Tecendo um ou outro comentário sobre o tema. E, na verdade, pouco mais.

Ouso dizer, com a propriedade que me é permitida enquanto habitante desde planeta, que na generalidade fazemos pouco a nível individual para tentar desacelerar este processo ou mesmo invertê-lo (se é que ainda é possível).

Em regra, imputamos a responsabilidade ao homem, na maioria das vezes sem fazer mea culpa, ou um ato de contrição, e seguimos sozinhos, de roupa nova e num bonito carro a gasóleo completamente alheados da ferida planetária já aberta.

Na verdade, agimos como se a possível solução para um problema que é transversal a todos, estivesse fora do alcance individual de cada um de nós.

E, em muitos casos, ainda que se reconheça o problema e se atribua intimamente o grau de seriedade e de urgência que ele merece, delegamos a tarefa de fazer algo mais significativo para instâncias superiores, subtraindo-nos à responsabilidade, quer individual, quer colectiva.

Agimos maquinalmente absorvidos nas nossas tarefas: abrimos torneiras, fechamos torneiras, descarregamos autoclismos, tomamos banhos de 30 minutos sob o pretexto de que estamos cansados e que merecemos. Todas estas tarefas triviais e do mais quotidiano que pode haver são pequenos atentados ao planeta. Já se percebeu que de momento me refiro sobretudo a água, ou à falta dela. Este Inverno como já se percebeu não tem havido chuva (com excepção destas últimas semanas). O Algarve e o Alentejo no panorama nacional são quem mais sofre, todavia este ano a situação de seca está a ser transversal a todo o país. A título informativo o mês de Fevereiro foi o 3.º mais seco desde 1931.

Enquanto acharmos que a resolução do problema está fora das nossas casas, e que é um assunto da competência dos governos, estamos a ser cúmplices e a hipotecar o nosso futuro e das gerações futuras.

Ninguém sente vontade de voltar a uma época pré industrializada onde as coisas se compravam a granel, onde as pessoas se movimentavam de bicicleta ou a pé, onde tomavam banho uma vez por semana, onde a roupa se limitava a 3 ou 4 peças.

Estou a ser radical propositadamente, mas somente para ilustrar, que foi o ideal de conforto da humanidade que nos fez chegar à situação onde nos encontramos. Os confortos não são gratuitos e a evolução tem um preço. Esse preço creio que já começamos aos poucos a amortizar e, faço sinceros votos, que a taxa de esforço não se agrave.

 

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