Uma das regalias que a empresa K onde Duarte trabalhava proporcionava aos seus trabalhadores, para isso bastando apenas subscreverem o documento de adesão, era a de lhes oferecer um seguro de grupo do ramo Vida, com cobertura complementar de invalidez total e permanente por doença, celebrado com a seguradora F, regalia essa divulgada no Manual da Empresa como dando direito, no caso da dita cobertura complementar, a uma indemnização aos trabalhadores em caso de incapacidade permanente que acarretasse diminuição da sua capacidade de remuneração em mais de dois terços. Para além desta sucinta informação, nada mais era especificado, nem por parte da empresa e nem por parte da seguradora.
Sucede que, devido a diversos problemas de saúde, mormente do foro cardíaco e neurológico, Duarte ficou incapaz para o exercício da sua profissão, incapacidade avaliada pela Comissão de Verificação de Incapacidades e que levou à sua reforma.
Ora, uma vez acionado o seguro, a seguradora recusou indemnizar Duarte. Para tanto, invocando algumas razões, nomeadamente, a cláusula da apólice que determinava que a incapacidade seja verificada por médico seu, o que no caso não tinha sucedido.
Todavia, entendeu o tribunal que é notório que a exclusiva comprovação da situação de invalidez por exclusiva banda de médico indicado pela seguradora assume clara contraditoriedade face à boa fé exigível, por implicar um desequilíbrio desproporcionado e, a final, uma penalização gravosa para o segurado que se vê, relativamente à consideração do seu estado, nas “mãos” exclusivas da seguradora, por isso, tal cláusula terá que se considerar abusiva e proibida.
Na realidade, prosseguiu a decisão judicial, Duarte, conhecedor da existência de um contrato de seguro de que era beneficiário, designadamente em caso de invalidez total e permanente, adquiriu a confiança de que, caso se viesse a encontrar em tal situação, teria direito a receber a indemnização contratada.
A exigência de “reconhecimento pelo médico da seguradora de que a pessoa segura está afetada duma invalidez total e permanente não é, em rigor, necessária para as finalidades do contrato de seguro. Está a impor-se a uma das partes uma restrição que não é justificada à luz daquelas finalidades; outros médicos teriam condições para fazer o reconhecimento da invalidez relevante com a competência e a objetividade adequadas. Não sendo necessária, aquela exigência não é proporcional e, não sendo proporcional, a cláusula que a compreende é nula por contrária ao princípio da boa fé.
Desta forma, bem foi a seguradora F condenada a indemnizar Duarte na quantia correspondente a 42 seus salários base, a indemnização prevista na apólice.