Aos novos autarcas, quadriénio 2021-2025: um mandato complexo e extremamente exigente num «aterrador mundo novo»
O país prepara-se, por estes dias, para mais um novo ciclo autárquico, agendadas que estão as eleições para o próximo dia 26 de Setembro. Quando a pandemia parece dar tréguas, diante a vacinação e sem novas mutações no vírus, eis que a natureza tem presenteado a Europa e o mundo com a sua fúria, patente em fenómenos extremos raros. Importa referir que as alterações climáticas não nos trazem fenómenos novos, mas tão somente o aumento da sua frequência, com consequências incalculáveis em termos sociais e económicos.
O Algarve, como todo o Mediterrâneo, situa-se numa área crítica a esse nível, por conseguinte é urgente prepararmo-nos para essa realidade, para a qual não há vacina que nos salve. O clima «benigno» que conhecíamos já não existe. Invernos cada vez menos chuvosos, verões com temperaturas anormais, chuvas torrenciais, com cheias e inundações, incêndios e a erosão dos solos, ou mesmo as tempestades oriundas do mar, sem esquecer a imparável subida deste último. Hoje, mais que nunca, é necessário ter presente na tomada de decisão o conhecimento científico, enquanto luz omnipresente, que deve guiar a nossa existência no planeta.
Esta nova realidade impõe desde logo a tomada de medidas de forma a minimizar o impacte das alterações climáticas na vida de cada um de nós. Temos de aprender a viver com um planeta zangado, ameaçando a nossa própria existência.
O papel dos novos autarcas é pois crucial na construção de um concelho preparado para o futuro, adaptado a fenómenos extremos.
São exemplo a subida do nível do mar, com a necessária relocalização de muitos edifícios em Armação de Pêra, condenados a inundações frequentes pela ação da ribeira de Alcantarilha e do mar, a proibição de novas edificações na primeira linha de costa, sob pena de perdas humanas e de pesadas indemnizações a suportar pelo erário público, já nos próximos anos. Impõe-se também o redimensionamento e substituição, no concelho, da maioria das redes de drenagem de águas pluviais, dotando-as de maior capacidade de escoamento, minimizando assim o impacte das inundações em meio urbano, enquanto em meio rural os edifícios próximos a linhas de água terão de localizar-se a uma cota muito superior à atualmente em uso. Sem esquecer a imperiosa gestão do bem essencial à vida, a água potável, cada vez mais escassa. Sendo o concelho de Silves fustigado frequentemente por inundações e incêndios, algo que se tornará ainda mais reiterado no futuro próximo, urge auxiliar os proprietários a definir uma estratégia para uma floresta resiliente, que favoreça a retenção de água nos solos e impeça o desenvolvimento de fogos de grandes dimensões.
Os terríveis efeitos da pandemia podem e devem ser minimizados com os milhões de euros disponibilizados pela União Europeia, a célebre «bazuca». Todavia, é preciso mais, estes milhões têm de permitir uma adaptação a um mundo diferente, que já nos entrou portas adentro.
Em suma, é preciso governar no presente com os olhos no futuro e não no passado, adaptando desde logo a organização interna das autarquias e não cair na tentação de reverter as freguesias extintas em 2013, quando cada vez mais se impõe a agregação de concelhos. Portugal é ainda hoje, a nível concelhio, o país traçado em 1836. Quase 200 anos depois, qualquer semelhança com a realidade de então é pura coincidência. Com boas vias de comunicação terrestres e digitais e os autarcas a transitarem de um concelho para outro, é grotesco a sociedade e o Estado manterem uma estrutura administrativa anacrónica, suportada com impostos incomportáveis, com ineficiências e perdas para a maioria. Urge pois a união entre vários municípios, bem como a concretização da regionalização.
Por todos estes motivos, sem esquecer o desenvolvimento de uma agricultura, indústria e economia sustentáveis e também de uma sociedade mais justa, a ação dos próximos autarcas é ainda mais determinante do que até aqui. Afinal, além de tudo o que conhecemos e precisamos estamos agora perante um catastrófico e inimaginável mundo novo, de consequências imprevisíveis para o Homem.
A todos os candidatos desejamos boa sorte.