Os bancos, como se sabe, sistematicamente exigem, em contratos de financiamento, a prestação de determinadas garantias, entre outras, a hipoteca, a caução, o penhor, a fiança, o aval, etc..
Estas duas últimas – a fiança e o aval – têm a particularidade de serem garantias pessoais, configurando-se, basicamente, como um determinado património a tornar-se responsável pelo pagamento de uma dívida alheia.
E também se sabe que, uma vez prestadas estas garantias, a sua desvinculação só é possível em determinadas e reduzidas circunstâncias (como anteriormente já foi exemplificado nesta coluna). Aliás, o aval é mesmo irrevogável, pura e simplesmente. Quer isto dizer que, uma vez prestado, já não é possível ser retirado.
Reforçando esta impossibilidade, o Supremo Tribunal de Justiça, em 2013, a partir de um caso que oferecia controvérsia, proferiu mesmo um acórdão uniformizador de jurisprudência (portanto, de seguimento obrigatório para os demais tribunais nacionais) estatuindo a seguinte doutrina: “Tendo o aval sido prestado de forma irrestrita e ilimitada, não é admissível a sua denúncia por parte do avalista, sócio de uma sociedade a favor de quem aquele foi prestado, em contrato em que a mesma é interessada, ainda que, entretanto, venha a ceder a sua participação social na sociedade avalizada”.
O caso controverso era o seguinte: tendo um banco, para conceder um financiamento em determinado montante de apoio de tesouraria a uma sociedade, feito a exigência, aliás comum, de que os respetivos sócios prestassem, a título de garantia desse financiamento, o seu aval pessoal (em livrança desde logo preenchida), mas, tendo um deles, posteriormente, deixado de ser sócio, por alienação da sua quota a outrem, se, por isso, teria o direito de também deixar de ser avalista, isto é, de denunciar o aval que prestara. Como se vê, a resposta do Supremo foi taxativamente negativa.
Mas, alteremos um pouco os dados da questão: em vez daquele contrato de financiamento em determinado montante, colocamos na hipótese um outro contrato, igualmente vulgar na atividade bancária, por exemplo, de abertura de crédito em conta corrente até determinado montante, por um prazo de seis meses, automaticamente renovável por períodos iguais e sucessivos (com o aval em livrança necessariamente em branco, uma vez que, incógnito o montante eventualmente no futuro em dívida), ainda assim, o sócio, que o deixou de ser, continuará vinculado ao aval que prestou?
Neste caso, pensamos que poderá vir a existir a possibilidade de desvinculação.
Com efeito, uma vez que estamos em presença de um contrato de duração prolongada e indefinida (renovações automáticas), daqui resulta que o avalista (de livrança em branco) se vinculou a uma responsabilidade sem termo temporal previamente definido. Assim, tendo sido devidamente comunicado ao banco que o avalista em apreço deixou de ser sócio, se, porventura, posteriormente, o banco, por incumprimento da sociedade, vier a preencher a livrança em causa, esse avalista já não estará vinculado ao seu pagamento, pois, beneficia, dada aquela indefinição temporal e a alienação da sua quota, do direito de resolver por justa causa o pacto de preenchimento que assinara.
O que, aliás, bem vistas as coisas, em rigor não colide com aquela doutrina do Supremo.
Olá viva,
Relativamente ao seu argumento de possibilidade de desvinculação, encontrei este caso em que pelo que percebo não é possível.
https://data.dre.pt/eli/acstj/4/2013/01/21/p/dre/pt/html