Figura incontornável da história recente do Algarve, Joaquim Manuel Cabrita Neto faleceu no passado dia 13 de Novembro, aos 77 anos de idade, no Hospital de Faro.
Afastado da vida pública desde 2007, por motivos de saúde, Cabrita Neto foi empresário, presidente da Comissão Regional de Turismo (1976-79), deputado à Assembleia da República (várias legislaturas entre 1979 e 1999), Governador Civil (1985-95), e também presidente do Conselho Directivo da Federação da Restauração, Cafés, Pastelarias e Similares de Portugal (1999), Vice-presidente da Assembleia Geral da Federação da Indústria Hoteleira e do Alojamento Turístico de Portugal (1999), Vice-presidente e depois Presidente da HOTREC – Confederação das Associações de Hotelaria, Restauração e Cafés da União Europeia (1999-2004), sedeada em Bruxelas, destacando-se como o primeiro dirigente associativo português e do sul da Europa a presidir a esta associação europeia.

Natural da Guia, onde nasceu, a 16/09/1940 era filho de Teófilo Fontainhas Neto e de Augusta Simões Cabrita Neto. Joaquim Cabrita Neto passou a infância em S. B. de Messines, onde frequentou a escola primária. Concluídos os estudos liceais, em Faro, rumou a Londres para se formar em Gestão de Empresas (Curso Superior de Comércio) na London School of Economics.
Em 1959 integrou a direção da empresa, fundada pelo pai, os Estabelecimentos Teófilo Fontainhas Neto, imprimindo-lhe uma gestão moderna, a que não eram alheios os conhecimentos que granjeara em Inglaterra.
Em 1969 fundou e dirigiu o Jornal Prolar, até à sua extinção (1975). Inovador mensário, divulgava notícias relacionadas com S. B. de Messines (subscrição Jardim Escola, pretensão de elevação a vila), mas também da região (criação de estudos universitários, ou apoio na subscrição para o busto ao Dr. Silva Nobre, em Faro), e simultaneamente servia de informativo e publicitário à empresa, sua proprietária.
Entretanto, em 1964, consorcia-se com Maria da Assunção Rua Espadinha Galo, natural de Loulé.
Simpático e cordial por natureza, Cabrita Neto desenvolveu intensa atividade social em S. B. de Messines. Pugnou pela melhoria das condições sociais e económicas dos messinenses, constituindo um dos rostos da Comissão Pró – Jardim Escola, da qual foi Tesoureiro. O seu nome é ainda indissociável da elevação da aldeia à categoria de vila a 08/03/1973, enquanto Secretário da Junta de Freguesia. Eleito em 1971 na designada lista “B”, numa vitória insólita por ser conotada com a oposição ao regime (a Acção Nacional apoiava a lista “A”).
Em 1973, Cabrita Neto era Presidente do Conselho Geral do Grémio de Retalhistas de Mercearia do Sul e Presidente da Assembleia Geral do Grémio do Comércio de Silves. Exercia ainda a vice-presidência do Grémio dos Industriais de Hotelaria de Faro (de que foi fundador em 1971, e da qual viria a ser presidente sobre a denominação de AIHSA), bem como a presidência da direção da Federação dos Grémios do Comércio do Distrito de Faro, além de integrar a Comissão Regional de Turismo e o Conselho Administrativo da Escola Hoteleira de Faro. Fez parte da XI Legislatura da Câmara Corporativa, eleito pelo Conselho da Corporação do Comércio.
Com a Revolução de 25 de Abril de 1974 muda-se com a família para os Olhos de Água, assumindo, na sequência da morte do pai, em fevereiro de 1976, a direção da empresa, onde se manteve durante alguns anos.
Nas primeiras eleições autárquicas livres, em 1976, foi eleito vereador da Câmara de Silves, como independente nas listas do PPD/PSD, partido a que adere oficialmente em 1979 e que veio a liderar na região. Foi também presidente da Assembleia Municipal de Albufeira (1979-82) e vereador na mesma autarquia.
A sua ação enquanto presidente da Comissão Regional de Turismo pautou-se por uma intensa dinamização e promoção do Algarve no estrangeiro. Ciente da necessidade de criar uma política de animação que inscrevesse a região no calendário de eventos nacionais, foi pela sua mão que surgiu o Cross das Amendoeiras, o Festival de Música, o Festival Nacional de Folclore ou o Festival da Cerveja.
Regionalista convicto, assumiu à frente do Governo Civil posições determinantes em defesa dos interesses do Algarve, não raras vezes contra e à revelia do seu partido. Como notou Idálio Revez no jornal Público, “chegou a ser visto como o «Alberto João Jardim do Algarve», embora a sua personalidade não se confundisse com a do ex-líder madeirense.”
Extremamente dinâmico na defesa dos interesses regionais, em outubro de 2002, em entrevista ao jornal Barlavento, e perante a possibilidade de instalação de portagens na Via do Infante, pelo governo do partido em que militava, o PPD/PSD, foi peremptório em afirmar: “Não quero acreditar que isso seja possível. Se qualquer ministro avançar com uma medida desse tipo, a gente pega nele e atira-o ao mar… (…). Serei dos primeiros a fazer todos os confrontos legais ou ilegais contra esse governo.”
Afastado repentinamente da vida pública em 2007, por a sua saúde não o permitir, não deixou de estar atento à região. Em março de 2011, em entrevista ao mesmo periódico, dava um grito de revolta pela apatia, inércia e desinteresse total dos responsáveis no Algarve: “Não vejo nada, nem ninguém a reivindicar diariamente, minuto a minuto, todo um esforço que se devia fazer por esta região”, ao que acrescentava: “Existe um desinteresse total. Morre-se por não fazer nada”, situação que considerava confrangedora e inadmissível. O corolário de toda a letargia regional chegou em dezembro desse ano com a instalação de portagens na Via do Infante.
Com um percurso de vida preenchidíssimo Cabrita Neto foi também Presidente da Assembleia Geral: do Sporting Clube Farense; União Desportiva Messinense; Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de S. B. de Messines; e Presidente da Direcção da Associação dos Bombeiros Voluntários de Messines.
O seu falecimento motivou a publicação de variados testemunhos de gratidão, oriundos de diferentes quadrantes políticos e de diversas Notas de Pesar, entre elas, a da Região de Turismo, CCDR, Municípios de Faro, Albufeira e Silves e também do Presidente da República.
A igreja de S. B. de Messines foi pequena para acolher, na tarde de 15 de Novembro, as várias centenas de pessoas anónimas, mas também dirigentes e elementos de distintas forças políticas, que no funeral prestaram a derradeira homenagem a um dos “mais carismáticos dirigentes políticos da região e um dos maiores responsáveis pela evolução histórica positiva do Turismo do Algarve” (Nota de Pesar da Região de Turismo do Algarve). Entre elas os presidentes das autarquias de Faro, Albufeira e Silves, da Região de Turismo do Algarve, vereadores, empresários, dirigentes associativos, deputados à Assembleia da República, jornalistas, ex-governadores civis, como Fialho Anastácio ou Valentim Rosado, e ex-autarcas, como José Viola ou Isabel Soares.
Cabrita Neto foi homenageado pela Junta de Freguesia de S. B. de Messines, em 2009, sendo ainda condecorado com a Comenda da Ordem do Mérito, pelo Governo da República Federal da Alemanha (1994), Medalha de Ouro da cidade de Faro (2008) e com o grau de Comendador da Ordem de Mérito (2010), pelo ex-presidente Cavaco Silva, de quem era amigo pessoal. Os serviços excecionais prestados ao turismo algarvio valeram-lhe também, a atribuição da Medalha de Ouro do Turismo (2003) e o Diploma de Mérito (2016), atribuídos pela RTA. Já este ano o Município de Albufeira impôs-lhe o Colar de Honra, no âmbito das comemorações dos 40 anos do Poder Local, pelo seu contributo para a história da Democracia naquele concelho.
Joaquim Manuel Cabrita Neto foi um dos mais ilustres filhos do Algarve da sua geração tendo pugnado acerrimamente na defesa dos interesses regionais com visão e determinação. Quando muitos se fixaram na capital, Cabrita Neto era categórico “prefiro ser sargento na minha terra, a capitão em Lisboa”.
Em suma, foi a voz activa e excepcional que raras vezes houve na região, fosse na Monarquia Constitucional, República ou no Estado Novo. Se é certo que nos últimos anos a sua saúde não lhe permitia atividade pública, com a sua partida extinguiu-se, definitivamente, a voz do regime Democrático, na defesa do Algarve e dos algarvios. Atualmente entregue a uma “defesa” atabalhoada e espartilhada por 16 concelhos, que agem como “estados autónomos”, enfraquecendo e anulando qualquer poder reivindicativo, no contexto nacional, cujas consequências se vislumbram dramáticas para a região.
Quanto a nós perdemos também um amigo, que a S. B. de Messines se deslocava sempre para exercer o seu direito cívico de voto, por aqui ter mantido oficialmente a sua residência. Um amigo ímpar em que o altruísmo, humildade e serenidade com que nos recebia causava-nos admiração. Obrigado Sr. Cabrita Neto! O Algarve vai sentir muito a sua falta.
À família enlutada reiteramos as nossas sentidas condolências, em meu nome e da Direção do jornal Terra Ruiva.