De um dia para o outro, os votos foram colocados nas urnas e um país e um continente mudam. O povo do Reino Unido da Grã-Bretanha votou para a saída da União Europeia, da qual fazia parte desde 1973.
A vitória foi longe de contundente e definitiva; uma margem escassa separava os cerca de 52% do “Leave” (Deixar) dos 48% de votantes do “Remain” (Permanecer). De uma só estocada, os alarmes tocam por todo o continente. Os britânicos têm 2 anos para saírem da União Europeia.
O voto pela saída da União Europeia pelo Reino Unido poderá ser encarado como um grito de revolta de uma parte substancial da população britânica, insatisfeita com a falta de legitimidade democrática do Parlamento Europeu e daquilo que entendem ser uma intromissão intolerável de um organismo supranacional nos seus assuntos internos. Há quem diga que foi um voto contra um processo de integração europeia demasiado rápido que não tem criado consenso suficiente entre os seus membros. Seriam todos assuntos legítimos e abertos a debate.
Infelizmente, o debate que dominou a campanha da saída da EU não foram as quotas de pesca, as regulamentações da UE, a crise do euro, a economia enfezada da Europa ou coisa que o valha. O tema dominante foi a imigração, especialmente dos países muçulmanos, o que dificilmente constitui um tema comunitário. Agora que o referendo terminou, é constrangedor ver que os vencedores aparentemente não têm um plano para a saída.
Os resultados do referendo não se deixaram esperar: o valor da libra caiu como não se via há décadas, o investimento parou e inclusive, várias instituições financeiras esperam deixar a “city” de Londres para outras paragens, o que obviamente, numa economia centrada em serviços financeiros, terá os seus custos em termos de emprego. A Tesouraria Britânica, equivalente ao nosso Ministério das Finanças, assume a necessidade de novos impostos e imposição de austeridade. Para além disso, existe a incerteza geral do que irá acontecer a todos os residentes britânicos um pouco por toda a Europa Comunitária.
Após o referendo, surgiram no interior da própria União Europeia algumas vozes a reclamarem referendos para o seu próprio país, e ironicamente, levantaram-se vozes a favor da saída da Escócia e Irlanda do Norte da União Britânica.
Desconfio que a União Europeia não irá conceder aos britânicos um acordo fácil, pois o mesmo serviria para alimentar impulsos de “independência” por parte de outros países. Receio que o acordo será penoso para a Grã-Bretanha, de modo a dissuadir quaisquer ruídos no interior da UE.
Neste ponto, creio que poderemos estar descansados cá no nosso burgo; Portugal tem com o Reino Unido a mais antiga aliança da Europa e não creio que haverá quaisquer dificuldades em construir relações bilaterais que reduzam o transtorno ao mínimo e assegurem todos os direitos dos britânicos residentes, dado os interesses de parte a parte.
É inevitável, no entanto, que haja consequências económicas para o nosso Algarve enquanto não se colocarem os pontos nos “is.”
Tamanha incerteza irá certamente afetar as decisões dos nossos residentes britânicos a médio prazo, no que toca a questões de permanência e de investimento. Espero que estas situações sejam sanadas rapidamente da forma mais positiva possível; o Algarve sem os nossos vizinhos britânicos não é o mesmo Algarve.