O 25 de Abril de 1974 apanhou-me quando andava no 1º ano do ciclo, nuns barracões improvisados que durante muitos anos fizeram de escola em Silves.
À hora que saíra de Messines, no autocarro de manhã bem cedo, nada fazia prever o magno acontecimento que irrompeu a meio da manhã: não havia mais aulas, os alunos que fossem para casa. Por entre o natural contentamento, queríamos saber o porquê deste feriado tão inesperado.
Mas das professoras, agrupadas em torno do rádio do minúsculo carro da professora Sol, não saía nenhuma explicação. A mais plausível foi-me dada ainda nessa manhã, pelo meu amigo Rui Tomé, por entre dois pavilhões, no maior dos secretismos: “os mouros estão a atacar Lisboa”.
E eis como tudo se encaixava tão bem, na cabeça de duas crianças de 10 anos que nunca tinham ouvido falar noutros inimigos que não os “mouros”. Nem admirava que as professoras ficassem a ouvir as notícias, em vez da novela “Simplesmente Maria”.
Acompanhada pelo Rui Tomé, regressei a casa. Na rua onde morava, reinava um ambiente de excitação, nervosismo, todos os vizinhos se reuniam junto à casa da Vizinha Bia e todos corriam para casa, ao som de um qualquer comunicado que soasse na televisão.
Mais tarde compreendi. A alegria. Os conceitos. Liberdade. Democracia. Independência.
Mas o que guardo com mais prazer é a memória dos dias em que a “malta grande” do liceu irrompia pelas salas, decretando que “hoje não há mais aulas, vamos para a manifestação”, e lá íamos nós, todos contentes, a fazer número, como naquela primeira vez que lá fui com o meu amigo Vicente, a gritar “Abaixo a Pive”, “Abaixo a Pive”, por termos percebido mal a palavra de ordem e o nome da polícia política.
( Texto e foto foram publicados na edição de abril de 2001, do Terra Ruiva)