Há dias, recebi um mail com a seguinte frase: “O português reclama de quê?” Depois, seguia a enumeração das caraterísticas que nos tolham, adormecem, anulam, vitimam. Desde a corrupção à ignorância e sei lá quantas mais. A seguir vinha a frase:” E admiramo-nos da crise em que estamos naufragando?”
Situo-me eu, agora, exemplificando com algumas dessas caraterísticas negativas. Uma:
“Descansa ela agora vai empregar-te já. Levei-lhe uma galinha bem gorda, e dispus-me ajudá-la quando fizer limpezas.”; outra: “Calha-me muito bem o meu patrão ser mesmo giro… Bem percebo o que ele quer…Ora vou fazer-lhe a vontade. Feio ele fosse…promover-me-á logo”; outra, “Contribuirei já para essa obra de caridade. Dizem que tal miséria é obra da governação a que o país tem estado sujeito. Imagine-se! Qual história! Será mas é do mau destino ou da má cabeça deles. Enfim, ajudemos lá, ficaremos bem vistos, e sem dúvida, terá boa recompensa quando desaparecermos…”; outra,” Que chatice! O meu filho não gosta de sopa. Esta noite vou-lhe dar a bola azul que ele tanto quer…Vai comer a sopa toda e talvez se habitue, olarila!”. Na verdade, temos muita lenha velha que deverá ser queimada se queremos autenticamente erguermo-nos.
Tenho estado a ler a História de Portugal de Oliveira Martins. Caramba! Tantas crises tem havido neste país. Cada geração devia conhecer todas, devidamente, para ajudarem a evitar, a não repetirem em cada futuro, os erros, as falcatruas, os crimes de cada passado. Afinal, evitarem almofadas para alguns se refastelarem, no gozo criminoso apenas dos seus interessezinhos, maribando-se para muitos outros que dizem bem defender, mas apenas, limitando-se a riscá-los da lista como números quando morrem, já mortos por tanto desprezo.
Diz Oliveira Martins de D. Manuel I: “Tinha espirito acanhado de negociante, ouvia todas as intrigas e usava o seu poder de rei para satisfazer todos os seus caprichos. Injusto era pequeno e cruel.
D. Francisco de Almeida escreveu-lhe da Índia: “Se cada dia há-de armar uma invenção, sem informação do que aqui vai, perder-se-á tudo, em pouco.”
A Corte portuguesa moldava-se no tipo das Cortes italianas, com exceção das orgias de punhal e veneno. Lisboa era abundância para uns e miséria para outros; saída em grande de emigração; os escravos eram muitos nas ruas, vindos de vários pontos donde iam dominando. Foi atingida grave crise económica e social. Isto passou-se no século XVI. E no XVII, continuava… Basta ler a obra de Padre António Vieira, entre outras diz: ”Quais são as consequências de um voto injusto no Tribunal? E no Conselho para obtenção de emprego? Vota o Conselheiro num parente porque é parente; vota no amigo porque é amigo; vota no recomendado porque é recomendado; os mais dignos, os mais beneméritos ficam de fora.”
E segue desejando que um dia isto termine.
Nós com maior conhecimento, não nos deixaremos enganar, encantar, tão facilmente, com patranhas bem armadas, precisamente, com esse fim, para conservarem, manterem os tais interessezinhos.