Este ano não haverá Natal para 120 pessoas, a maioria jornalistas do jornal i e do semanário Sol. A notícia foi conhecida na altura em que o “espírito natalício” supostamente começa a inundar os corações. A empresa detentora dos dois títulos, a Newshold, liderada por Álvaro Sobrinho, ex-presidente do BES Angola, vai fechar estes jornais e criar um novo projeto que integrará um terço dos funcionários. E esse terço, sorte a deles, mantém o emprego, mas aceitando salários inferiores aos atuais.
Há uma frase que diz que cada jornal que encerra é uma perda para a democracia. A ser assim (como acredito que o seja) a doce democracia corre o risco de se tornar muito amarga.
O problema é que, cada vez mais, a informação é vista como um produto, não só acessível como também gratuito. Nos jornais, rádio e televisão ainda vamos mantendo um contacto próximo com a publicidade, que é o suporte destes meios. Mas na internet e sobretudo nas redes sociais, que um número crescente de pessoas usa como meio de acesso à informação, a perceção de que a informação está ao alcance de cada um e que não custa nada tornou-se quase a regra.
E no entanto… e no entanto a produção de informação tem um custo. Um custo tanto maior quanto maior for o desejo de apresentar um produto profissional e original, que fuja à informação preparada e igual para todos, proveniente das agências de comunicação.
Com a crise e a queda das receitas da publicidade, os jornais são os mais afetados. No atual contexto só sobrevivem as publicações sustentadas por grandes grupos económicos, que o fazem com objetivos muito concretos ( e não, não é por amor à democracia), ou publicações específicas que contam com leitores e anunciantes dedicados.
Salvaguardando as diferenças de dimensão – pois um jornal é um jornal, seja o Terra Ruiva ou o Washington Post – os problemas que se colocam à imprensa em todo o mundo são idênticos e procura-se a solução que lhe permita sobreviver, não como uma moribunda que se arrasta à espera do fim dos seus dias, mas sim como uma convalescente capaz de continuar a fazer o seu trabalho com qualidade e com esperança de o melhorar continuamente.
No nosso caso, temos tido a sorte de poder contar com o apoio de alguns empresários e de pequenas empresas e comércio local que vêm no Terra Ruiva muito mais do que uma possibilidade de anunciar o seu negócio, reconhecem um projeto de cariz associativo, funcionando numa base de voluntariado e de muito trabalho não remunerado, que consideram importante para a sua freguesia e concelho de Silves.
Este espírito de responsabilidade social, por parte de privados, não tem, curiosamente (?), sido acompanhado por parte das Juntas de Freguesia do concelho e, num passado recente, durante alguns anos, pela Câmara Municipal. Efetivamente, todos os anos, em dezembro, o Terra Ruiva solicita às Juntas a publicação de uma mensagem de Natal. Apresentamos várias propostas, a preços diferentes. Em 15 anos de edição, 100 euros foi o valor mais alto que alguma Junta esteve disponível para pagar. Ainda assim, apesar do valor tão modesto e não atualizado há muitos anos, há quem recuse esta colaboração.
Em 15 anos de edição, apenas a Junta de Messines publicou todos os anos a sua mensagem de Natal. Silves, Alcantarilha e São Marcos da Serra foram publicando regularmente, com exceção de anos “difíceis” em termos financeiros. Mas Algoz, Tunes e Armação de Pêra responderam afirmativamente apenas três vezes. A freguesia do Algoz publicou a última mensagem em 2002, Tunes em 2005, Armação de Pêra em 2003. Já a freguesia de Pêra publicou duas vezes, uma em 2001 e outra em 2008.
Ao nosso pedido, quando há resposta, o teor é sempre o mesmo “não há verba disponível”.
Digo eu que, sabendo que todos os anos fazemos este pedido, podiam deixar 100 euros, no fundo da gaveta, até ao mês de dezembro, uma quantia irrisória num orçamento anual de uma junta. Questiono aqui o cumprimento do conceito de “responsabilidade social”. Com as suas limitações e os seus defeitos, com artigos que não agradam a este ou àquela, o Terra Ruiva é o único meio de comunicação social do concelho e é feito com dificuldades que são do conhecimento dos presidentes e executivos das juntas…
Faz falta um jornal como o nosso que tenta contribuir para que haja mais cidadãos informados e esclarecidos, que divulga as pessoas e as realizações do nosso concelho. Não temos lucro, nem é esse o nosso objetivo, mas fazemos um trabalho sério e responsável que deveria ser apoiado por aqueles que gerem os dinheiros públicos.
Não há informação gratuita e certamente não há jornais que possam viver do ar.
Terminando como comecei, não há natal, este ano, para a imprensa portuguesa.
Mas seria extremamente injusto, tendo falado de quem nos falha, que não tivesse uma palavra de apreço, estima e agradecimento para quem nos ajuda. A todos os que têm estado connosco, muito obrigado.
Um Bom Natal e um Melhor Ano Novo.
P.S. – Dois dias depois deste texto ter sido publicado, na edição de dezembro do Terra Ruiva, foi anunciado que o jornal Público abriu um programa de rescisões para trabalhadores e que irá deixar de publicar a sua revista, para fazer frente a mais de três milhões de euros de prejuízo. Já no sábado, dia 5 de dezembro, o jornal Expresso avançou com a notícia de que o empresário angolano António Mesquita está a preparar a sua saída do grupo Global Media que é proprietário de meios como o Diário de Notícias, Jornal de Notícias, O Jogo, Dinheiro Vivo e a rádio TSF. Em 2014 este grupo foi alvo de reestruturação que implicou o despedimento de 160 trabalhadores e a confirmar-se esta saída, as perspetivas não são risonhas.