No tempo em que escrevo estas linhas, a Catalunha prepara-se para as eleições autonómicas da região. Os independentistas, no entanto, pretendem fazer destas eleições um plebiscito para a independência da região face a Espanha, procurando ter uma maioria absoluta que legitime as suas pretensões.
Os partidos assumem posições diferentes nos dois lados da barricada: uns defendem o status quo, mantendo a ligação a Espanha; outros defendem a independência; há ainda uns que defendem maior poder para o governo autonómico catalão, transformando Espanha num estado federalista.
O sentimento nacionalista da Catalunha tem vindo a exacerbar-se nos últimos anos, e muitos catalães sentem que as transferências que fazem para o estado espanhol não se justificam face ao retorno para a região. Além disso, a identidade regional da Catalunha, motivo de orgulho entre os catalães, sempre distinguiu os catalães do resto da Espanha.
O caminho para a independência não é fácil. A constituição espanhola defende a unidade indivisível do país e torna ilegal qualquer tentativa de secessão, seja de que forma for. Como bandeira moral, os independentistas reclamam o “direito á autodeterminação dos povos”, herdado da Revolução francesa e inscrito na Declaração dos Direitos do Homem.
A independência requereria a criação de todas as instituições que fazem de uma nação um país: um banco central, um exército e toda a estrutura jurídica de tribunais.
Do ponto de vista económico, a independência seria um processo tumultuoso: milhares de empresas mudariam as suas sedes e atividades para outros pontos de Espanha, face à incerteza da região, tal como aconteceu durante os receios independentistas do Quebec, no Canadá. Há ainda a pequena questão da dívida nacional espanhola, e qual seria a parte da mesma a caber a um estado catalão independente.
Uma Catalunha independente também teria de recriar toda a rede de acordos e parcerias internacionais, desde embaixadas a acordos fiscais e comerciais. A Catalunha, tal como a União Europeia já o admitiu, teria de solicitar posteriormente a entrada na União Europeia, com a agravante de que seguramente contaria com o veto de Espanha.
Uma solução jurídica encontrada noutros casos de secessão ou pulverização de países passou pelo reconhecimento do novo estado como “sucessor” do anterior, herdando as competências e acordos. Seguramente tal não acontecerá neste caso.
Tratam-se de questões difíceis e sem fácil resolução, com implicações imediatas para os cidadãos.
No entanto, este movimento pela independência da Catalunha, bem como outros pela Europa, como o caso da Escócia, surgem num momento interessante da história europeia. É paradoxal que estes movimentos de secessão surjam precisamente na altura em que diversas vozes clamem por uma maior integração europeia, a nível político e fiscal, como resolução dos problemas europeus, culminando naquilo que muitos esperam que sejam uns “Estados Unidos da Europa” federais. Mais paradoxal é o facto de muitos destes movimentos independentistas, tanto na Catalunha como na Escócia, defenderem a permanência dos seus novos países na União Europeia. Procuram nova soberania, apenas para perder parte dela a seguir. É o paradoxo da mudança: quanto mais as coisas mudam, mais elas permanecem as mesmas.
PS: Já depois de ter escrito este texto surgiram os resultados das eleições: embora os partidos independentistas tenham tido uma vitória nas urnas, o povo catalão não lhes concedeu a maioria. É um claro sinal de que os catalães, embora queiram mais autonomia e respeito do estado espanhol, não pretendem seguir em caminhos separados dos da Espanha. Os Catalães, apesar de tudo, parecem sentir que Espanha também é o seu país.